Joana

Joana 01

Enquanto a manuelina fachada da Estação do Rossio permanece tapada, para obras de reabilitação, é possível apreciar, no interior, outras curiosidades não menos artísticas. Um viajante que suba ao primeiro andar, se não tiver pressa de apanhar o comboio para Sintra, descobrirá algo de estranho pendurado no teto. No lugar dos candeeiros há rodas de bicicletas e garrafas de vinho. Não se trata de uma excentricidade de quem manda nas estruturas ferroviárias. É apenas uma instalação artística.

Joana 02

A instalação tem o curioso nome de Joana e é da autoria da artista plástica Ana Jotta (que já ganhou o Grande Prémio Fundação EDP Arte, em 2013). Parei para apreciar o trabalho da artista (porque já sabia o que ia encontrar), mas a maioria da pessoas nem sequer se dignou a olhar para o que estava pendurado no teto. Na verdade, as estações ferroviárias são locais de passagem, onde reina a pressa e a agitação do quotidiano, pelo que é difícil que alguém se lembre de olhar para o teto (algumas pessoas, aliás, passavam cabisbaixas, sinal de que a vida que arrastavam, entre a casa e o trabalho, não lhes dava tempo para descobrir obras de arte). Assim, o efeito do trabalho de Ana Jotta parece perder-se bastante, no caos apressado que é a Estação do Rossio. Por outro lado, a obra tem um significado que também não é fácil de descortinar. Confesso que tive de me socorrer de leituras prévias, antes de ter empreendido a visita à estação. Assim, os candeeiros de Ana Jotta (feitos de materiais vulgares como as rodas de bicicletas e as garrafas de vinho) são uma paródia aos candelabros, esses objetos de luxo e de ostentação que o poder político e financeiro tanto gosta de ter em casa. Ana Jotta vai buscar a paródia ao ready made de Marcel Duchamp (figura tão incontornável quanto controversa da arte moderna). Um exemplo do ready made é o famoso e polémico urinol (A Fonte, como foi intitulado), em que o Duchamp, numa  manifestação radical da intenção, elevou a obra de arte um objeto de uso comum que servia apenas para mijar.

E pronto: entrar na Estação do Rossio não é só apanhar o comboio e perder-se na monotonia da vida entre a casa e o trabalho. Há toda uma arte a descobrir. Pode gostar-se dela ou não, mas, ao menos, ajuda-nos a pensar. Só não cheguei a compreender por que é que a obra se chamava Joana… Quem era a Joana dos candelabros que assombrava a imaginação de Ana Jotta?… De repente, lembrei-me da outra Joana, da Vasconcelos!…